TENTE NÃO SER UM NERD TARJA PRETA POR UM SEGUNDO #19



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THE WIRE: DUAS TESES. Francis Fukuyama [o próprio escritor de O Fim da História] dedicou o seu artigo na última edição da revista The American Interest à série The Wire [ou A Escuta, na tradução da Band]:

O mais impressionante mérito de The Wire [...] é como ela humaniza todo um segmento da sociedade americana que a maioria dos americanos brancos prefere ignorar (e geralmente ignora). [...] Nós rapidamente percebemos que a maioria dos personagens morando nas partes ruins de Baltimore estão presos lá por ter azar no lugar e no momento em que nasceram [...].

Enquanto o mundo de The Wire está populado por indivíduos que fizeram as suas próprias escolhas morais, os resultados concretos que eles alcançam estão, no final das contas, condicionados de forma aguda pelas instituições destorcidas que os rodeiam. O prefeito negro de Baltimore, o seu chefe de policia negro e o branco chefe de operações não se importam muito com a qualidade de vida da área central da cidade; eles se preocupam em manter a taxa de homicídios baixa para que o crime não possa ser usado contra eles ou seus chefes na próxima eleição. Os eleitores brancos dos subúrbios pensam que a solução para o problema é mais policia, mais prisões e punições mais severas. As escolas têm professores que variam de carreiristas a indivíduos dedicados que querem fazer a coisa certa, mas que não tem os recursos que eles precisam para operar de forma eficiente em uma cultura formada por gangues de drogas.

"Omar está ouvindo".

Por coincidência, no final do mês de agosto, Larry Kaufmann já tinha escrito outro artigo [bem menor] sobre a mesma série, só que sobre outra ótica e para a revista The American Culture:

O produtor do programa, David Simon, provavelmente acredita que o tráfico de drogas é um bom exemplo do capitalismo em sua forma mais crua, mas se é assim, isso apenas mostra que ele não entende a natureza do sistema econômico ele (acha que) critica. O tráfico de drogas não é capitalismo, porque ele não tem nenhuma lei. Por exemplo, não existe direito de propriedade ou soluções imparciais para disputas. O sucesso financeiro depende, no fim, da violência, não de trocas volutnárias entre consumidores e produtores rivais competindo para alcançar as suas necessidades na forma mais eficiente. Isso é a lei da selva, não o mundo do mercado.

Por outro lado, o governo está por todos os lados na área central de Baltimore. Moradores buscam que os políticos cuidem deles, e os mesmos políticos cinicamente jogam grupos étnicos e raciais uns contra os outros e prestam favores aos poderosos e bem relacionados, não aos seus eleitores (basicamente, esse é o plot da terceira temporada). O governo também controla o disfuncional sistema educacional e, embora existam exemplos de professores dedicados e bem intencionados, eles são pisoteados por pesquisadores educacionais carreiristas, consultures e sindicatos de setores públicos que estão muito ocupados cobrindo as suas próprias costas, nenhum dos quais com qualquer incentivo para melhor a educação (quarta temporada).

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