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Prophet: Remission
Brandon Graham, Simon Roy, Farel Dalrymple e Giannis Milonogiannis
[Image Comics, 2013]
Nas cinco primeiras páginas de Prophet: Remission, [uma
encarnação do] personagem título acorda em um planeta exótico, vomita uma
cápsula de estimulantes e arrebenta a cabeça de um bicho que é uma mistura de
ALPACA com POLVO com PESADELOS com um facão-machado. É a introdução da primeira
história e para a temática do encadernado em si: Prophet é o que O Senhor dos
Anéis seria se fosse protagonizado pelo SPACE CONAN.
Sim, estamos falando do mesmo Prophet que foi criado por Rob Liefeld em 1992 [mais um sim: as ombreiras foram reduzidas no novo design].
Perceba que a numeração das edições reunidas no encadernado começa em #21. Acontece
que Liefeld, em 2012, entregou alguns dos seus personagens para quadrinistas
indies. Prophet, no caso, caiu nas mãos de Brandon Graham [Multiple Warheads,
King City], que pegou a ideia, levou ela para um futuro longínquo e
indeterminado e a multiplicou por mil: o Prophet original, um Capitão América Extreme,
serviu de base para exército de clones do agora arruinado Império da Terra.
Partindo disso, Graham organizou a série em diferentes arcos
[são quatro nesse encadernado], cada um protagonizado por um Prophet recém
despertado em um canto diferente da galáxia. Cada um deles também é desenhado
por um quadrinista diferente [aqui, Simon Roy, Farel Dalrymple e Giannis
Milogiannis, além do próprio Graham] que, DIZEM, se mantém estável com o “seu”
Prophet na continuação da série.
Apesar dessa rotatividade, as histórias têm mais semelhanças
do que diferenças: todas elas contam a jornada de um Prophet entre dois pontos,
tentando cumprir uma missão. São expositivas: grande parte da história é
dedicada a mostrar o ambiente no qual a trama se desenvolve. E são molduradas pelos vetores Conan way-of-life, ficção científica, escatologia e sátira.
Para ficar no primeiro arco, desenhado por Simon Roy [com a
ajuda da excelente colorização de Richmond Ballermann]. Depois daquelas cinco
páginas iniciais, nós temos outras cinco que nos mostram um sempre silencioso
Prophet chegando à Jell City, o seu destino inicial e uma espécie de CIDADE
CANCRO MOLE. Nelas, o personagem come, caça, enfrenta uns bichos bizarros e
encontra uma SINISTRA “oonaka meat farm”:
Depois da fazendinha ali, o resto da edição se passa dentro
da Jell City. São dez páginas dedicadas a nos mostrar como funciona o lugar,
uma espécie de colméia com uns insetos molengas e canibais divididos em castas.
É onde temos a primeira sátira evidente [a dissimulada: não existem vilões
evidentes; o próprio LUGAR é que é sinistro e putrefato]. Essa aqui...
Na segunda edição, a jornada passa por uma “caravana taxa”,
onde “monstros gigantes que funcionam como fábricas vivas” passam “o que começa
como sedimentos crus e celulose pelo sistema digestivo de cada criatura, até
que ele se transforma em puro cikade refinado”. A frase sozinha, que descreve esse
cruzamento entre os Mitos de Cthulhu e a Centopeia Humana, já permitiria chamar
todo o encadernado como world-building escatológico.
| Isso aí é isso mesmo que você está pensando. |
O fechamento da história se dá em uma edição que é um pouco
mais sci-fi, mas de um jeito ainda bárbaro [pense em Stargate, com o seu primitivismo hiper-tecnológico]: o ainda
silencioso e esfomeado Prophet tem que chegar em uma espaçonave, escalando uma
montanha/torre gigantesca que alberga, é claro, a sua própria civilização
bizarra.
Dá pra imaginar Prophet, com a sua fantasia heroica em
versão ficção científica satírica, na Métal Hurlant. E, de fato, muita gente
viu no gibi influências europeias: o traço de Roy e de Dalrymple, ainda,
lembram uma versão caricata do de Juan Gimenez, enquanto que o de Graham faz o
mesmo com Moebius.
Só que eu te digo: essa influência é indireta. Saca só como
desenhava Graham dez anos atrás que você vai ver onde quero chegar:
![]() |
| Soletrando: o cara publicou em uma revista chamada MANGAPHILE. |
Claro que, além dessa “influência na influência”, ajuda na
vibe européia que o ritmo não seja muito acelerado: “construir” os mundos
bizarros da série exigem a sua cota de exposição [como você deve ter percebido
nos trechos de texto transcritos ali em cima] e planos mais abertos [o que
reduz o ritmo da narrativa]. Mas isso, como se vê, é facilmente explicável
pelas necessidades narrativas. Também é verdade que as páginas tem muitos
quadrinhos de formas geométricas regulares uma marca dos álbuns europeus... mas
também dos mangás.
Fica mais óbvio se você comparar o monstrengo da caravana de
taxa com um ohmu, os insetos gigantes de Nausicaa do Vale do Vento, uma das
principais obras de Miyazaki:
Prophet é isso aí, só que em versão macho: estão lá as armas
naturais, a “tecnologia orgânica” e o traço texturizado. Só que sai a princesa
ambientalista, entra o troglodita esfomeado. [RESENHAS]

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