NFN#77



ENTREVISTA #1. Berry Pearl publicou em seu blogue uma entrevista de Jack Kirby para Jerry Connelly, de 18/9/1974. O início da entrevista já trata da criação do Capitão América -- particularmente interessante notar que foi uma criação espontânea diante do fervor patriótico, e não o contrário [o personagem foi criado com base em interesses obscuros, capitalistas, malvados e imperialistas, que queria fomentar o fervor patriótico]:

Jerry Connelly: Vamos conversar sobre o Capitão América, provavelmente a sua criação mais famosa. Capitão América foi originalmente publicado em março de 1941, uns oito meses antes que os Estados Unidos entrassem na Segunda Guerra Mundial. Na capa da primeira edição, você mostrou o Capitão América dando um soco direto no queixo de Adolph Hitler. O Capitão América foi criado especificamente para lutar a Segunda Guerra?

Jack KIRBY: Sim, eu acredito que foi uma reação espontânea da minha parte, e de meu colega Joe Simon. Nós discutimos isso na época. Existia um fervor patriótico em todos os lugares. Era o clima adequado para esse tipo de coisa. O Capitão América foi um super-herói único, de um tipo específico. Existiam vários outros super-heróis sendo desenvolvidos à época, e o Capitão América foi o primeiro a ter um tema patriótico. O meu estilo era particularmente adequado para esse tipo de super-herói, e deu muito certo.


ENTREVISTA #2. Laura Sneddon entrevistou Grant Morrison, no New Statesman. A conversa passa por várias de suas polêmicas recentes – como, por exemplo, a declaração "Batman é gay":

"Mas o negócio é que, isso foi o oposto do que eu disse. [...] basicamente o que eu disse [...] é que você pode facilmente relacionar o aspecto fetichista-couro-preto-noturno de Batman e a masculinidade de Batman e conseguir um Batman gay. Mas, como eu disse, no final ele não é gay porque ele não tem vida sexual, na verdade. Ele é apenas um aventureiro... algumas vezes eles mostram ele com garotas, outras ele parece não estar saindo com garotas.

Mas eles apenas pegaram a parte que soa legal, que é 'Batman é muito, muito gay, diz Morrison!' E foi isso, tive que lidar com aquilo -- pessoas ficaram realmente furiosas comigo por causa disso.

Sobre cair fora dos quadrinhos mainstream:

"É, apenas me pareceu que eu já tinha dito muito, sabe", ele diz. "Eu sabia que estava chegando no final de Action Comics na [edição] 16, sabia que eu estava chegando no final de Batman na edição 12, de Batman Incorporated, e apenas pareceu que eu tinha todas essas outras coisas sendo construídas, que eram completamente diferentes daquilo, e pareceu como um momento muito bom mesmo de parar de fazer gibis de super-heróis mensais. E também trabalhar com tantos artistas na Action Comics, não é que os artistas sejam ruins, mas é que as vezes trabalhando com três ou quatro caras ao mesmo tempo, isso significa que você está escrevendo a edição 14 antes de ter escrito a 12 e então você está enviando seis páginas da edição 13 para outra pessoa. Então era apenas muito agitado. Apenas não queria mais fazer isso. E como as coisas estavam chegando a um final natural... [...]"

E:

"Então eu apenas percebi que... apenas começou a parecer muito desagradável trabalhar com uma cultura de fanáticos por quadrinhos na qual todo mundo está furioso contigo o tempo todo, e te dando a responsabilidade por processos e coisas que eu não tem nada que ver com a minha vida, honestamente, e com as quais eu logo não vou ter conexão nenhuma".


ENTREVISTA #3. E já que estamos, também tem essa, de Gary Panter, entrevistado por James Romberger do Publishers Weekly. Sobre DalTokyo, compilação de tiras recentemente publicada pela Fantagraphics e pretexto da entrevista [além de uma tripla postagem aqui mesmo no NFN DIÁRIO], Panther falou:

Quando eu comecei a desenhar DalTokyo, tinha a necessidade de colocar no papel uma idéia com a qual eu estava incomodando os meus amigos desde 1972 -- a idéia de uma colônia marciana criada pelo Texas e os japoneses que também era um projeto de arte formal e metafórico. Não sabia como isso seria até que eu comecei a desenhar e trabalhei para incluir todas as noções de ficção-científica que eu tinha e queria desenhar. Comecei contando uma história complicada com algumas histórias cruzadas. Quando eu voltei a fazê-lo, anos depois, tinha liberdade total garantida pelo Sr. Ishii da Riddim e então continuei imaginando as histórias, mas concentrando em fazer variações dos desenhos e fazendo com que fosse mais como poesia ou leitura de folhas de chá. Ao longo do caminho, comecei a fazer que as pontas soltas fossem visíveis de novo. E o final é bastante claro e parece um final, eu acho.


COMBO BREAKER! Jason Thompson resenhou Pluto, de Naoki Urasawa, no Anime News Network -- uma espécie de remake de Astro Boy, de Osamu Tezuka, só que adulto:

A maior diferença óbvia entre Pluto e o original é que Astro Boy era um manga shonen e Pluto é um manga seinen, publicado em uma revista dirigia a adultos de meia-idade (adultos que leram o Astro Boy original quando eram jovens, talvez?). Dessa forma, Pluto também é um gibi de super-herói, o "quadrinho e super-herói sombrio e realista" popularizados por hqs dos anos 80 como Watchmen de Alan Moore. Ainda que os quadrinhos para crianças de Tezuka tenham mais violência e drama que qualquer quadrinho americano de super-heróis da mesma época (graças à censura do Comics Code Authority), de forma que apenas adicionar mais violência não fizesse sentido, tanto Watchmen quanto Pluto pegam um gênero infantil e tentam fazê-lo "adulto", fazê-lo mais sério e profundo. É muito supor, mas eu me pergunto se Urasawa e Nagasaki também foram influenciados por Moore, especialmente considerando que a sua série atual, Billy Bat, também é uma desconstrução de super-heróis/indústria-dos-quadrinhos, que como o Miracleman de Alan Moore, começa com um primeiro capítulo inteiro no estilo de uma hq dos anos 40-50? Por outro lado, a narrativa de Urasawa é completamente diferente da de Moore -- é muito, muito mais simples e com menos informação, ainda que, claro, isso seja uma diferença entre os quadrinhos ocidentais e os japoneses de forma geral. Watchmen tem 400 páginas e Pluto, 1600, mas você leva muito mais tempo para ler Watchmen.


EROTIC-CHIC. Paul Gravett publicou, também em seu blogue, a sua introdução ao terceiro volume da Milo Manara Library, coletânea de obras do italiano publicada pela Dark Horse. O texto trata sobre as colaborações de Manara com o seu amigo Federico Fellini.


A tua vó SABE e DESAPROVA o motivo pelo qual esse é
o único link da postagem de hoje que você clicou.

Sobre Manara e os filmes de Fellini, Gravett comenta:

Ao compor as suas páginas e narrativas, e em várias referências visuais, Manara foi influenciado por filmes e especificamente por aqueles feitos por Fellini, em especial em suas séries, cada vez mais sofisticadas e fluídas, HP e Guiseppe Bergman. A sua admiração pelo diretor culminou na criação de Untitled, uma hq-homenagem formada por quatro páginas oníricas protagonizadas por um desconcertado Marcello Mastroianni, de chapéu e toga. Manara encheu elas de referências a filmes de Fellini, de Casanova ao transatlântico S.S. Rex em Amarcord, e adicionou um aceno a Nino Rota, que morreu em 1979, o compositor de várias trilhas de filmes do Fellini.

Já sobre Fellini e os quadrinhos:

O entusiasmo de Fellini pelos quadrinhos, incluindo a obra de Manara, não era nada novo. Em sua infância nos anos vinte e trinta, o pequeno Federico devorou as edições traduzidas para o italiano de clássicas tiras de jornal americanas como Mickey Mouse, Bringing Up Father, Tim Tyler’s Luck, Mandrake, O Fantasma e Flash Gordon, publicadas por Edizioni Nerbini em Florença, junto com os seus próprios personagens italianos. Essas lhe incutiram a vontade de desenhar, e, quando jovem no final dos anos trinta, no caminho de Rimini a Roma e os estúdios Cinecittà, Fellini encontrou trabalho na Nerbini, contribuindo para o seu semanário satírico 420. Questionado sobre o início de sua carreira em uma entrevista filmada com o crítico francês Francis Lacassin, Fellini também lembrou sua contribuição para os roteiros do Flash Gordon da Nerbini, feitos depois que o regime fascistas de Mussolini proibiu a importação dos originais americanos. "Eu apenas continuei com a história, por antecipação, a partir do que eu tinha lido e do que tinha sido publicado até aquele momento, como os vários episódios teriam sido configurados. Eu tentei imaginar uma continuação da história, enquanto Giove Toppi, um ilustrador de Nerbini, tentou imitar o estilo gráfico do artista Alex Raymond".

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